quinta-feira, 19 de julho de 2012

Ensopadinho de Mandi com Pirão do Mesmo



Como um monte de primeiras coisas e momentos em nossas vidas, o primeiro peixe a gente também não esquece. Comigo foi assim, um momento mágico, fantástico! Eu devia ter uns 8 ou 9 anos, estava sozinho sentado dentro de uma canoa apoitada na baixada do mercado em Iguape/SP, onde passávamos as férias. Joguei na água minha linhada de mão, que tio Dito Lula e meu pai entralharam para mim, e uns 2 minutos depois... Tchum! Aquele puxão forte! Tomei um danado dum susto... Foi um “Meu Bom Jesus!” seguido de uma alegria incontida e lá estava eu, com o coração quase saindo pela boca, meio afobado, recolhendo a linha que trazia no anzol um mandi de uns dois palmos, minha primeira pesca, meu primeiro peixe.

Fiquei tão feliz, tão maravilhado, ali sozinho naquela canoa, na beira do mar pequeno, de frente pro pirizal, que peguei minhas tralhas, meu “peixão” e fui embora para casa daquele jeito, de moleque, sabe? Meio correndo, meio andando, meio pulando com o meu mandi ainda pendurado no anzol. É desses momentos simples cheios de significado e alma que somos feitos, não é mesmo? Dá para esquecer?

Crédito da Foto: Paulo Henrique Zioli
O Mandi

A palavra mandi vem do tupi mãdi'i e é o nome dado a diversos peixes de couro da espécie pimelodus, como o mandi amarelo, o mandi chorão e o mandi tinga encontrados em importantes bacias hidrográficas do nordeste, do sul e do sudeste do Brasil, como a Bacia Amazônica, a do Araguaia-Tocantins, a do São Francisco, a do Prata e a do Ribeira de Iguape, onde podem ser encontrados nadando próximos ao fundo, na beira dos rios, em poços, remansos e boca de riachos.

Crédito da Foto: Universidade de Louisiana
Primo menor dos grandes bagres siluros como a pirara e o pintado, o mandi pode alcançar até 40 cm de comprimento e pesar até 3 Kg. Alimenta-se de tudo, é então onívoro, preferindo larvas de insetos, algas, moluscos, pequenos peixes e fragmentos de vegetais. Sua carne é clara e de sabor muito suave.

RECEITA

Facílimo | de 4 a 6 Porções | Uns 40 minutos

INGREDIENTES

2 ou 3 mandis de bom tamanho
4 tomates maduros, sem pele nem sementes, picados
2 colheres de (sopa) de óleo
2 dentes de alho amassados
2 cebolas picadas
1 punhado de alfavaca e cheiro verde picados
Suco de 1 limão
Sal a gosto
Farinha de mandioca artesanal

Dica: Quer deixar o negócio chique e mais irresistível ainda? Acrescente alguns pitus.

Você Vai Precisar
Duas panelas médias com tampa.
Um coador ou peneira.

PREPARO

Crédito da FotoBlog "Come-se" de Neide Rigo 
“Conserte” (limpe) os mandis e lave-os bem, por dentro e por fora. Tempere-os com o suco de limão, o sal e deixe tomar gosto por uma meia hora.

Importante: Como com qualquer bagre, tome cuidados com as esporas das nadadeiras dorsais e lombar do mandi na hora de limpá-los. Estas esporas tem um serrilhado invertido que é fácil de entrar e difícil de sai da pele, além de possuírem toxinas e bactérias que causam muita dor caso você se machuque com elas.

Corte os peixes em postas e reserve as cabeças para fazer o pirão.

Crédito da FotoBlog "Come-se" de Neide Rigo 
 Em uma panela aqueça o óleo e refogue a cebola e o alho. Junte os tomates picados, a alfavaca e o cheiro verde e refogue mais um pouco.

Importante: Retire um pouco deste refogado e reserve para usá-lo no cozimento das cabeças para o pirão. Preste atenção!

Quando os sabores do refogado forem liberados, coloque o peixe e misture com cuidado.

Crédito da Foto: Frango com Pequi
Quando o peixe estiver começando a embranquecer, acrescente um pouco de água, baixe o fogo, tampe a panela e deixe a coisa acontecer.

Enquanto o peixe cozinha, em outra panela coloque as cabeças com um pouco do refogado que você reservou anteriormente. Reservou mesmo, né? Coloque água, acerte o sal e deixe cozinhar.

Bom, neste momento você tem duas panelas no fogo, então preste atenção:

1.  Verifique de tempos em tempos se o peixe já está cozido, estando tudo beleza, desligue o fogo e reserve.
2. Quando o cozido das cabeças do mandi fizer um caldo saboroso, desligue o fogo, acerte o sal, se você quiser acrescente aquela sua pimentinha e misture tudo. Coe o caldo e vá juntando farinha de mandioca aos poucos até dar ao pirão uma consistência mole e reserve.


Sirva o ensopadinho de mandi, com o pirão á parte, acompanhado de um arroz branco fresquinho e uma saladinha bacana.

Divirta-se e Delicie-se!

sexta-feira, 13 de julho de 2012

Colocando a Culinária Caiçara no Seu Devido Lugar


Crédito da Foto: Veja - Comer e Beber
A Culinária Regional – A Culinária Caiçara

A culinária é uma das expressões mais simpáticas, naturais, influentes e transformadoras de uma sociedade ou comunidade. Quando estamos lá no meio de facas, colheres, temperos e panelas na beira do fogão, preparando ou nos deliciando com um belo prato caiçara, estamos tocando em nossa história, alimentando nossa alma e, de certa forma, expressando quem somos. Nenhum alimento que entra em nossas bocas é neutro. Além de nutrir nosso corpo, impacta nossa experiência, nos transforma e dá corpo a uma dimensão cultural, histórica e gastronômica que é o espelho de uma sociedade.

Crédito da Foto: Chef Eudes Assis - Por uma Cozinha Caiçara e Criativa
Qualquer cultura externa que entre em contato com a nossa, será impactada por nossos costumes, nossa arte, nossa música e também pelos pratos, aromas e sabores de nossa culinária. Ao mesmo tempo em podemos  comemorar as semelhanças entre culturas distintas e a nossa, somos instigados a nos deliciar com nossas diferenças, experimentando, mesclando e absorvendo novos costumes ingredientes, pratos, texturas e gostos que contribuirão com nossa própria culinária. Não há como não influenciar e ser influenciado.

Nós brasileiros - índios, portugueses, espanhóis, italianos, japoneses, árabes, africanos, mamelucos, caboclos, caipiras, caiçaras, etc. - somos frutos de uma mistura tenra, perfumada e saborosa de diversas culturas. Um apanhado diverso, rico e fantástico de sabores que recheiam nosso caldeirão gastronômico. Isso tem grande valor!

Temperos - Farofa de Banana - Banana da Terra Frita
Robalo Recheado com  Farofa de Camarão - Ova de Tainha Frita - Palmito Assado
Um dos traços mais significativos da relação entre comida e cultura é nossa memória gustativa. A associação entre determinado sabor e uma circunstância específica frequentemente ocorre em nível individual, mas essa relação também ocorre no âmbito da sociedade. Tal como existe a “saudade da comida da avó”, também existe a “saudade da comida caiçara”, uma memória gustativa ao mesmo tempo individual e coletiva, que se constitui em elemento essencial para a consolidação dos laços de identidade, neste caso, do povo aqui do litoral.

Fritada de Camarão - Porção de Frutos do Mar - Moqueca Caiçara
Sirizada - Peixe Recheado Assado - Tainha Assada (Moquém) na Folha da Bananeira
Nesse sentido, a memória gustativa acrescida dos saberes e sabores, das técnicas e práticas culinárias são geradoras e formadoras de culturas regionais como a Cultura Caiçara que foi sendo formada pelas mãos de diversos povos na presença de um mar generoso, uma Mata Atlântica riquíssima e mais um tanto de ecossistemas coligados, como manguezais, estuários, costões, restingas, rios e riachos que com toda a sorte de ingredientes disponíveis, na prática, definiram nosso estilo culinário.

A Cozinha Caiçara - Da Ameaça Insossa da “Globalização”, a Redescoberta de Nossos Aromas e Sabores

As comunidades tradicionais caiçaras e as cidades com forte influencia da cultura caiçara, tem sentido cada vez mais as influências culturais e gastronômicas desse nosso mundo moderno, agitado e globalizado. Não há como deter esse movimento. O mundo está aí, aberto, livre e cheio de opções tentadoras que nos chegam através das maneiras mais simples, como também pela mais alta tecnologia de nossos celulares, TVs digitais e internet.  Falando nisso, você também pode acessar o Cozinha Tradicional Caiçara do seu celular.



A chegada da modernidade urbana as estas comunidades tem sido outra fonte de pressão a preservação das raízes de nossa rica culinária caiçara, que muitas vezes esquecida ou desprestigiada, se refugiou dentro das cozinhas familiares, das festas típicas locais e regionais e dos menus de restaurantes, hotéis e pousadas que resistindo à padronização insossa e nada criativa da “modernidade” vão além dos excessivamente dispersos e repetitivos frangos à passarinho, filés à parmigiana e à cubana, peixes à belle meunière e camarões à grega e ao thermidor. Adoro todos, mas não quero tê-los como as únicas opções disponíveis.



Alguns especialistas, chefs e estudiosos do assunto ainda hoje alertam para o quase desaparecimento da culinária caiçara mais tradicional e realmente muitas técnicas, ingredientes, receitas e pratos perderam-se na história. Por outro lado, aqui e ali, podemos notar diversas ações voltadas a chamar a atenção para a importância da preservação e da valorização da identidade, e da cultura de nossas comunidades tradicionais e cidades litorâneas. São esforços públicos, não governamentais, privados e de iniciativas individuais como o Cozinha Tradicional Caiçara aqui, que buscam estudar, registrar, resgatar, compartilhar e preservar os mais diferentes aspectos da riquíssima cultura tradicional caiçara.



Este movimento de busca pelas raízes culinárias, do entendimento de uma cultura através de sua gastronomia, da valorização de produtos e ingredientes locais, práticas culinárias e pratos típicos já está bem consolidado em diversos países pelo mundo e está adquirindo cada vez mais importância por aqui. Porque então deixar a genuína, simples e deliciosa gastronomia caiçara, uma expressão cultural de nosso país e de nossa região, em segundo plano?

Caranguejada - Marisco Lambe Lambe - Manjuba Frita
Siri Mole - Paçoca de Carne Seca - Moqueca de Manujuba
O que chamamos de tradicional, de típico e de regional - que para muitos pode ser um retrocesso, um saudosismo ou algo sem potencial comercial - é justamente o que está sendo cada vez mais reconhecido, valorizado e alardeado por todo o mundo!

Lições de Além Mar

Estou sonhando? Não! Os europeus de maneira geral, os japoneses, os chineses e outros povos pelo mundo já sabem e praticam há muito tempo a valorização e a preservação de suas culturas, locais e regionais, seus ingredientes, temperos, queijos, vinhos, massas, embutidos e tudo que se refere a seus pratos típicos, receitas, técnicas de preparo e utensílios de cozinha, enfim sua gastronomia.

Ao valorizar e destacar sua originalidade são respeitados mundo a fora, pelo que muitos de nós caiçaras, infelizmente, entendemos como algo sem grande valor. Por lá eles registram, protegem e usufruem socioeconomicamente de seus regionalismos inclusive com seus selos de origem controlada e outros títulos. Veja o exemplo da Pizza Napolitana que, em 2009, foi protegida pela Comissão Européia, junto com mais 44 produtos, com o selo de Especialidade Tradicional Garantida (Specialità Tradizionale Grantita – STG).

Avesso a xenofobia e longe de qualquer preconceito, afinal adoro tanto as pizzas como os sushis, kibes, strudells e a parilla argentina, por que insistimos em desmerecer o que é nosso e valorizar o que vem “de fora”? Modismo? Será que é mais fácil fazer uma porção de provolone a milanesa do que uma porção de manjubinhas? Por que nós caiçaras, assim como os povos citados, não podemos também valorizar, viver bem e em paz com o “quem somos”, o “como fazemos” e com o “o que sabemos fazer”?


Um Caminho

Como podemos ser regionais e globais ao mesmo tempo? Como podemos ser tradicionais e vanguardistas de uma só vez? Estas são as perguntas “que não querem calar”. Respondê-las implica na evolução de nossas ideias, no desenvolvimento gradual de uma percepção mais positiva de quem somos e na transformação gradual das crenças limitadores, que possivelmente temos, sobre nós mesmos. As respostas a estas perguntas envolverão os mais diversos aspectos de nossa cultura, onde se inclui nossa gastronomia, como uma das opções mais ricas, vigorosas, saborosas e prazerosas do Brasil e de neste “novo” mundo.

Pô, você está louco! Tá ficando velho e chato! Tá viajando na maionese! Não, não e não! Apesar de gostar bastante deste molho francês ou das Ilhas Baleares que reivindica sua origem, eu não viajo na maionese... eu viajo é no pirão! No nosso pirão!



Aquela deliciosa receita da sua e da minha avó, passada de geração a geração, que usa o frescor dos ingredientes locais, preparada com carinho e de forma singular, está com tudo! Quase como uma resistência a esse mundão globalizado, com poucas surpresas, pratos padronizados e muitas vezes sem graça que saem de cozinhas compartimentadas e cosmopolitas, as culturas regionais buscam, cada vez mais, resgatar e valorizar suas cozinhas locais carregadas de significado e cultura.

A EVOLUÇÃO: Da Cozinha Indígena, às inovações da Chef Ana Bueno do restaurante Banana da Terra especializado na Cozinha Caiçara, passando pela cozinha tradicional da Dona Alzira de Rio dos Patos - Superagui/PR na lente de Caron Piazote 
Os que estão buscando este resgate e esta valorização, grupo onde me incluo, estão muito bem acompanhados. Vejam o que diz Alex Atala, um dos chefs brasileiros mais premiados, dono do 4º melhor restaurante do mundo e o melhor da América do Sul, segundo a lista World’s 50 Best Restaurants de 2012.

Eu, pessoalmente, não consigo achar que um ovo é menos importante do que uma trufa. Então, sou um militante de uma cozinha da terra, de uma cozinha patrimonial brasileira, porque o que levou a França, Itália, Espanha e o Japão aos altos patamares da cozinha foi o orgulho da cultura regional. Na França, um chef é tão respeitado porque ele faz comida francesa, para pessoas francesas, que comeram comida francesa a vida inteira. É a qualidade do trabalho que confere a ele esse status. No Japão, um sushiman é honrado pelo mesmo motivo. Acredito, portanto, que um bom cozinheiro brasileiro tem de demonstrar essa mesma habilidade com a nossa cultura.”
Alex Atala

Quer mais exemplos da força do que é regional, tradicional? Então aí vai! Vejam o próprio conceito de Terroir base dos critérios de seleção de produtos com Denominação de Origem Controlada e muito utilizado pelos franceses, mundialmente famosos por sua gastronomia:

"Terroir é um conjunto de terras sob a ação de uma coletividade social congregada por relações familiares e culturais, e por tradições comuns e de solidariedade na exploração de seus produtos."

Longe de querer colocar a Cozinha Caiçara dentro do complexo conceito de Terroir, quero somente destacar a força que tem o regionalismo por este mundo afora. Não é suficiente para convencê-lo da importância da Cozinha Regional Caiçara? Então continue lendo!

A Declaração de Lima: Carta Aberta aos Cozinheiros do Amanhã

Outro dia estava pesquisando sobre gastronomia e me deparei com a Declaração de Lima – Carta Aberta aos Cozinheiros do Amanhã. Foi inevitável encaixar a Cozinha Caiçara na perspectiva colocada por esta declaração e me permitir imaginar que tudo que significa a Cozinha Caiçara é uma tendência, é o futuro. Me explico!

Para vocês terem uma noção e entender o quero dizer, a Declaração de Lima foi elaborada por uma elite mundial de chefs, conhecida como G9, entre eles estão nomes como o prório Alex Atala, o italiano Massimo Bottura, o americano Dan Barber, o japonês Yukio Hattori, o dinamarquês Rene Redzepi, o espanhol Ferran Adrià, o francês Michel Bras e o peruano Gastón Acurio. Todos reconhecidos em todo o mundo e premiadíssimos.

Neste documento os chefes declaram aos cozinheiros do futuro, as atitudes e os valores com os quais devem estar comprometidos, tendo como objetivo indicar novos caminhos aos que no futuro deverão “transgredir as fronteiras de suas cozinhas e aceitar os desafios que virão”. Para os chefes do G9 a cozinha é “mais que uma resposta à necessidade de se alimentar” ou “a procura da felicidade” é uma “Ferramenta de Transformação”. Leia a declaração:

Com relação à natureza
O trabalho de vocês depende dos frutos da natureza. Assim, vocês são responsáveis por defendê-la, usando sua cozinha e sua voz como instrumento de recuperação e promoção de determinadas variedades e espécies. Com esse alinhamento, espera-se que os novos cozinheiros promovam e pratiquem, com a terra e a cozinha, um sistema de produção sustentável.

Com relação aos valores
Vivemos num tempo em que a cozinha pode ser uma forma de autorrealização. A cozinha é hoje um campo em evolução constante no qual intervêm disciplinas múltiplas. Por isso, é importante que vocês encarem suas inquietudes, sentimentos e sonhos com autenticidade, humildade e, sobretudo, paixão.

Com relação à sociedade
Vocês são um produto de suas culturas, e através delas, herdeiros de um legado de sabores, costumes gastronômicos e técnicas de cozinha. Esse ponto estimula o cozinheiro a contribuir, por meio de sua cozinha, ética e conceitos estéticos, para sua cultura e a identidade de seu povo. Que se comprometa também com o desenvolvimento econômico de sua sociedade e dos produtores locais, podendo gerar riqueza local sustentável e fortalecer economicamente sua comunidade.


Com relação ao saber
Vocês têm a oportunidade de gerar conhecimento, seja desenvolvendo novas ou tradicionais receitas, seja participando de projetos de pesquisa profunda. E, assim como se beneficiaram das lições de outros, vocês têm a responsabilidade de compartilhar o que aprenderam.

Preciso dizer mais alguma coisa? Não, né! Pensem... A Cozinha Caiçara nasceu híbrida, resultante da miscigenação contínua de ingredientes, técnicas e pratos originados nas culinárias indígena, portuguesa, espanhola e africana. Assim sendo, a Cozinha Caiçara é um testemunho vivo da formação do povo brasileiro, portanto um inegável patrimônio cultural nacional e como tal, com todo o respeito e a devida importância deve ser tratada.

Sempre achei que é nesta fantástica mistura e no uso de ingredientes locais e regionais que reside a originalidade e a força da Cozinha Caiçara. Aqui, pequenino e humilde, este blog viu-se como parte de um movimento, cada vez maior, de fortalecimento da Cultura Regional Caiçara ao buscar resgatar os saberes e sabores caiçaras, promover o conhecimento, a valorização e o respeito à sua importância dentro da gastronomia nacional.

Embora a culinária regional tenha perdido algo de seu brilho, acho que esse processo faz parte de um ciclo. Existe, hoje, um movimento que não é meu, mas de profissionais do país inteiro, de norte a sul, militando por cozinhas regionais com muita propriedade. Creio que esse retorno a nossa origem faz parte do processo de amadurecimento de nossa cultura. Essas pessoas defendem suas cozinhas regionais, suas origens, o que eu acho muito bonito.”
Alex Atala

Muito mais que esperar que alguém venha nos descobrir e nos dar valor, devemos é nos redescobrir, nos valorizar e assim nos destacar neste mundo louco, agitado e globalizado em que vivemos e que a tudo padroniza.

Valorizemo-nos e Sejamos Felizes!

quarta-feira, 27 de junho de 2012

Viva o Fandango Caiçara!!

Crédito da Foto: Araquém Alcântra
APOIO TOTAL DO COZINHA TRADICIONAL CAIÇARA!

O Diário Oficial da União (DOU) desta segunda-feira, dia 25 de junho, publicou a abertura de prazo que qualquer pessoa apresente sua manifestação a respeito da proposta de registro do Fandango Caiçara como Patrimônio Cultural Brasileiro, pelo Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional (IPHAN).

O pedido de reconhecimento foi apresentado pelos seguintes institutos:

  • Associação de Fandangueiros do Município de Guraqueçaba,
  • Associação de Cultura Popular de Mandicuéra,
  • Associação Cultural Caburé,
  • Associação dos Jovens da Juréia,
  • Associação Rede Cananéia,
  • Instituto de Pesquisa Cananéia,
  • Associação dos Fandangueiros de Cananéia e
  • Instituto Silo Cultural.

O pedido de registro também tem o apoio de toda a comunidade. Para saber mais vá ao site do Iphan clicando aqui!





Divirta-se!!


sexta-feira, 22 de junho de 2012

Camarão com Chuchu, um Clássico Caseiro do Litoral


Crédito da Foto: Blog "Um Pouco de Tudo" de Monica Vogt
O Camarão com Chuchu

Mesmo o chuchu sendo originário da América Central, o camarão com chuchu é um prato brasileiro, típico e bastante difundido por todo nosso litoral. Não é muito fácil precisar a origem do delicioso e reconfortante camarão com chuchu.  Talvez não seja de origem caiçara, mas acabou se transformando em um dos pratos tradicionais das comunidades e cidades do nosso litoral. É difícil encontrar algum caiçara que ao ouvir falar do camarão com chuchu não solte um “- Huumm!”

Segundo Câmara Cascudo, historiador, antropólogo, advogado e jornalista que se dedicou ao estudo da cultura brasileira, o ensopado de camarão já era consumido no centro do Rio de Janeiro no fim do século XIX, com influência dos guisados da cozinha portuguesa. Nesta versão da origem do prato, a inclusão do chuchu é creditada aos cozinheiros da Confeitaria Colombo, onde o camarão ensopadinho com chuchu já constava nos cardápios de 1894. 

Câmara Cascudo (na lente de Carlos Lyra) e Carmen Miranda
A iguaria aparece também na letra da música “Disseram que eu voltei americanizada”, sucesso cantado por Carmem Miranda (1909 –1955). Na música a pequena notável afirma que depois da língua, o vínculo com a comida é o mais resistente quando se está longe da pátria. No samba ela encerra o recado dizendo: - “Eu sou do camarão ensopadinho com chuchu”.

Jovelina Pérola Negra, uma das grandes damas do samba, também cantou o saboroso camarão com chuchu. Com música e letra de Nei Lopes, a canção fala sobre vontade de fazer um camarão com chuchu e a decepção com preço do camarão: -“Fiquei na intenção, camarão tá caro prá chuchu”.

  
Chuchu Beleza

Assim como o tomate, o chuchu é considerado um fruto, pois possui sementes internas envolvidas pela parte comestível. É um alimento com alto teor de fibras, de fácil digestão e pouquíssimas calorias. Possui também potássio, vitamina A e vitamina C. Os brotos de chuchu são ricos em nutrientes como as vitaminas C e B, e também são excelentes fontes de cálcio, fósforo e ferro.

Crédito da Foto: Zoi di Gato

RECEITA

Fácilzão | 8 Porções | Uns 40 minutos

INGREDIENTES

1kg de camarões médios ou sete barbas;
1kg de chuchu;
1 cebola grande ralada;
4 tomates maduros;
1 xícara de coentro de folha larga e alfavaca picadinhas em partes iguais;
3 colheres de sopa de óleo ou azeite de oliva;
½ pimenta dedo de moça, sem sementes, picada;
Sal a gosto.

Você Vai Precisar
Vasilhas
Panela com tampa

PREPARO

Lave os camarões, descasque-os, tempere-os com sal e reserve.

Descasque e corte os chuchus em cubos e reserve.

Numa panela em fogo médio aqueça o azeite e refogue a cebola picada até que fique transparente. Acrescente os tomates, os temperos verdes e a pimenta picada misturando e refogando essa base.

Crédito da FotoBlog "Um Pouco de Tudo" de Monica Vogt 
Junte o chuchu em cubos e refogue por uns 2 minutos misturando tudo. Acerte o sal e deixe cozinhando em fogo baixo por uns 15 minutos e vá acrescentando água aos poucos.

Dica: Se você já está acostumado com os tempos de cozimento do camarão e do chuchu, acrescente o chuchu logo após o camarão e cozinhe os dois juntos. Isso dará mais sabor ao prato. Se você ainda não está familiarizado com estes tempos, refogue primeiro o camarão permitindo que ele libere seus sucos e sabor, por 3 ou 4 minutos, retire-os da panela, acrescente o chuchu e cozinhe-o. Depois acrescente o camarão reservado e termine o cozimento do ensopado.

Acrescente o os camarões, misture tudo, acerte o sal e continue cozinhando em fogo baixo o mínimo necessário para que os camarões soltem seu sabor enriquecendo o ensopado e fiquem cozidos.

Vá verificando a quantidade de caldo do cozimento para secar demais o ensopado e acrescente mais água se achar necessário. Alguns preferem um ensopado mais seco, enquanto outros o preferem mais úmido. Faça o que preferir. Eu gosto de bem úmido.

Sirva com arroz branco, acompanhado de uma boa farinha artesanal ou uma farofinha de alho e manteiga, e aquela sua pimentinha.

Deleite-se!!

segunda-feira, 18 de junho de 2012

O Impressionante Pitu, no Bafo


Muitos chamam os caiçaras de “O Povo do Mar”, mas não só dos alimentos e recursos vindos do nosso generoso Atlântico eles vivem, como também não vivem apenas da mandioca e de seus subprodutos como talvez muitas publicações superficiais querem nos fazer acreditar. Ter atingido o estado de arte na utilização da mandioca não significa depender unicamente dela. Aliás a mandioca merece um capítulo especial que desenvolverei em outro momento por aqui.

As comunidades tradicionais caiçaras e as cidades com forte cultura caiçara, verdadeiros patrimônios culturais brasileiros, estão localizados em um ambiente privilegiado, o Bioma Atlântico, composto de importantes ecossistemas brasileiros, aquáticos e terrestres, riquíssimos em biodiversidade que garantem aos caiçaras uma variedade imensa de possibilidades para o desenvolvimento de uma culinária simples saborosíssima e com alma, entre outros aspectos culturais e sociais fascinantes.



O caiçara tradicional associa as expressões de seu modo de vida diretamente à utilização deste território e de seus consideráveis recursos naturais, tanto em sua alimentação, como condição para seu desenvolvimento social, cultural e econômico. O saber culinário caiçara nasce da força de sua capacidade de adaptação a este meio ambiente magnífico e abundante que o rodeia.



Ali, neste encontro entre a Mata Atlântica e o mar, os caiçaras têm a sua disposição imensos recursos encontrados nas encostas da Serra do Mar, nas planícies costeiras, estuários (mar de dentro), restingas, lagoas, manguezais, costões rochosos, praias, no alto mar, nos rios que percorrem as planícies costeiras, e nos riachos sombreados que descem da Serra do Mar e deságuam nas lagoas, estuários e no marzão formando importantes bacias e deltas que compõe nossa admirável paisagem costeira.



Nestes rios e riachos podemos encontrar uma infinidade de espécies de peixes e camarões deliciosos entre eles os pitus, para o qual estamos dando destaque hoje. Podemos encontrar também mariscos e caranguejos originalmente vindos do mar que a milhares de anos se adaptaram a água doce ou salobra. Estas espécies contribuem para o vigor e a alegria das cozinhas caiçaras.

Despesca de Viveiro de Pitus no Rio Ribeira de Iguape  (15 jun 2012)
Os pitus são camarões nativos brasileiros que vivem e se reproduzem em água salobra ou doce. São conhecidas cerca de 12 espécies de camarões de água doce nas regiões caiçaras entre o litoral sul do Estado do Rio de Janeiro e o Paraná, muitos deles chamados de pitus. Popularmente qualquer camarão de água doce, com garras longas, grande e agressivo é chamado de pitu.

Macrobrachium acanthurus - O Pitu
Nos rios e riachos que integram a bacia do Rio Ribeira de Iguape e nos cursos de água da Estação Ecológica da Juréia e da Ilha do Cardoso podemos encontrar a espécie Macrobrachium acanthurus que é a mais conhecida na região como pitu, e que também recebe o nome de camarão canela. Este camarão habita água doce e, às vezes, salobras, escuras, geralmente paradas ou pouco movimentadas, possuem hábitos noturnos e onívoros (que comem de tudo, vegetais e animais).

Macrobrachium carcinus - O Pitu Açu
A espécie Macrobrachium carcinus também encontrada na região e conhecida como lagosta do ribeira. Estas espécies habitam os rios e as baías em áreas de desembocadura de rios e riachos, onde é encontrada sob as pedras e entre a vegetação submersa das margens.

Macrobrachium olfersii e Macrobrachium potiuna - O Pituzinho
Macrobrachium heterochirus Macho e Palaemon pandaliformis
Nesta região também podem ser encontradas outras espécies importantes de camarões de água doce como Macrobrachium heterochirus, Macrobrachium potiuna além de Palaemon pandaliformis e Macrobrachium olfersii, estas duas últimas de menor tamanho. Todos popularmente chamados de pitus. 
Fonte: Crustáceos decápodes de água doce com ocorrência no Vale do Ribeira de Iguape e rios costeiros adjacentes, São Paulo, Brasil - Sérgio Schwarz da Rocha; Sérgio Luiz de Siqueira Bueno

Com uma textura e um sabor considerados por muitos superior às espécies marinhas, o impressionante pitu foi até citado por Pero Vaz de Caminha na “Carta a el-rei D. Manuel sobre o achamento do Brasil” em 1° de maio de 1500: “...Enquanto aí estávamos, foram alguns (índios) buscar marisco e apenas acharam alguns camarões grossos e curtos, entre os quais vinha um tão grande e tão grosso, como em nenhum tempo vi tamanho.”

De lá para cá, infelizmente a destruição de seus ambientes nativos e a pesca excessiva e descontrolada fizeram o Macrobrachium carcinus, o pitu-açú ou lagosta do Ribeira,  ser considerada uma espécie ameaçada, listada como vulnerável pelo IBAMA em 12 estados brasileiros. Hoje sua captura, venda e manutenção em cativeiro são proibidas por lei.

Pesquei muito pitu com puçá no Rio Ribeira de Iguape. Era só passar o puçá ou uma redinha com cuidado por baixo dos aguapés e pronto! Os maiores a gente conseguia pegar com um covo pequeno tendo como isca banana, espinhas e cabeças de peixe e cacos de cerâmica.

Com o pitu podemos fazer uma série de suculentos pratos tradicionais que começarei postar aqui no blog, iniciando pelo delicioso Pitu no Bafo, cuja receita segue adiante. Resgate ingredientes nativos esquecidos, estimule o comércio justo que beneficie as comunidades locais, garanta que o que você está comendo venha de fontes sustentáveis e divirta-se!



RECEITA

Fácil | 4 porções | 20 minutos

INGREDIENTES

1kg de camarões pitu inteiros (com casca e cabeça);
½ dose de cachaça boa;
1 tomate;
2 dentes de alho;
1 cebola;
1 punhado de coentro de folha larga e alfavaca, em partes iguais;
1 pimenta dedo de moça, sem sementes, bem picada.

Dica: Quer deixar o negócio chique? Acrescente algumas fatias bem finas de gengibre e um pouco de capim santo (a parte clara) bem picada.

Você vai Precisar
Uma panela funda com tampa

PREPARO

Lave bem os pitus, tempere com sal e reserve;
Pique bem o tomate, a cebola, o alho, os temperos verdes e a pimenta dedo de moça;
Forre o fundo de uma panela funda com todos os temperos, acrescente a cachaça e acomode por cima os pitus;
Tampe a panela e cozinhe em fogo médio por aproximadamente 10 minutos. Com cuidado, mexa os temperos e vire os pitus de vez em quando para que cozinhem por inteiro e absorvam os sabores do molho;
Quando os pitus estiverem bem vermelhos estarão prontos;
Sirva com um arroz branco fresquinho e uma salada bacana.

Delicie-se!

quinta-feira, 7 de junho de 2012

É Festa!!!... As Tainhas Estão Chegando!!!

Crédito da Foto: Samir Rogério/VC Repórter (Palhoça/SC)
Os meses sem “R” estão aí! Além dos caranguejos estarem gordos é época de Tainha! Os preparativos anteriores, as orações de proteção e fartura; as bençãos as embarcações e as rede da véspera, e aquele frio na barriga antes de ir para o mar vão culminar num período festivo e agitado de abundância, companheirismo e tradição nas comunidades caiçaras de todo o litoral das regiões Sul e Sudeste. Desde o dia 15 de maio está aberta oficialmente a temporada de pesca da tainha e agora, no início de junho, elas estão chegando maiores e com suas ovas maravilhosas.

Tchelo (meu primo) e as Maravilhosas Tainhas - Junho de 2005
Todo caiçara que se preza espera esta época mais fria do ano com avidez. É o momento de cercar os cardumes, passar as redes e lancear atrás das belíssimas e deliciosas cabeçudas do lombo azul e cinza que movimentam a economia, a cultura, o turismo e, é lógico, as cozinhas do todo o litoral caiçara. É o espetáculo da fartura! É tempo de festa!


Crédito das Fotos: Mariza Ortiz Carvalho e Guto Kuerten/AgênciaRBS
A pesca da tainha é a segunda modalidade de pesca extrativa marinha mais importante do Brasil. Ocorre desde antes de nossa colonização, com os índios tupi-guarani, até os dias de hoje. É notável a mobilização de todos os grupos sociais litorâneos em torno deste peixe nos meses de captura (maio a agosto). A tainha tem um verdadeiro poder de “aglutinação” das populações costeiras ao longo de nosso litoral.


Crédito das Fotos: Rogério Kreidlow e A Notícia
Poderíamos bater mó papão sobre a importância da pesca da tainha, seu simbolismo e como ela se constitui em um denominador comum da cultura caiçara, mas acho que basta apenas dizer que, não importa se por acaso, por sincronicidade ou por um desígnio divino, a natureza presenteia as comunidades caiçaras com as maravilhosas tainhas e suas ovas fantásticas justamente no período mais frio e menos produtivo das roças e do mar. (Saiba mais em Tainha na Rede). Viva a natureza!!

Comemore, divirta-se e se delicie, pois a festa começou!

Acesse a Programação de Eventos Gastronômicos Caiçaras aqui do Blog, escolha o evento mais próximo a você, pé na estrada e divirta-se, ou vá até uma peixaria de sua confiança, compre uma tainha bonitona e delicie-se com as receitas abaixo:

RECEITAS

Crédito da Foto: A Vitrine do Sabor

OVAS DE TAINHA FRITAS

Fácil | 4 porção | 20 minutos

INGREDIENTES
4 ovas de tainha de bom tamanho
2 limões galegos
Farinha de trigo que baste
2 colheres de sopa de salsinha picada
Óleo para fritura
Sal e pimenta a gosto

Você Vai Precisar
Frigideira alta
Duas vasilhas ou travessa fundas para temperar e empanar
Pegador ou escumadeira
Escorredor coberto com papel absorvente

PREPARO
Limpe as ovas com cuidado para não romper a membrana que as envolve.
Tempere-as com o suco de um limão, o sal e a pimenta. Deixe tomar gosto por uns 10 minutos.
Passe-as pela farinha de trigo e frite-as em fogo médio até que fiquem cozidas e douradas.
Escorra em papel absorvente, cubra-as com a salsinha picada para decorar e sirva-as inteiras ou em rodelas, com o outro limão cortado em gomos e aquela pimentinha. Podem ser servidas como aperitivo ou acompanhadas de uma saladinha.

Crédito da Foto: Editora Abril
MOELA DE TAINHA

Fácil | 4 porções | 10 minutos

INGREDIENTES
1 kg de moelas de tainha
2 limões galego
4 dentes de alho picados
Sal a gosto
Azeite de oliva para fritar

Você Vai Precisar
Frigideira
Vasilha para temperar

PREPARO
Lave bem as moelas e escorra-as.
Tempere as moelas com sal e o suco de um limão.
Em um frigideira bem quente, coloque o azeite e frite as moelas. Vá revirando-as e quando começarem a dourar. Acrescente o alho picado e termine de dourar.
Retire-as do fogo, cubra-as com a salsinha picada para decorar e sirva-as como aperitivo com o outro limão cortado em gomos e aquela pimentinha.

VEJA TAMBÉM:

Crédito da Foto: Come-se

DELICIE-SE!!
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